Dias atrás, li um texto assinado por Alexandre Maron intitulado “Linkedisney – A Ilusão do Discurso Perfeito no LinkedIn”. O título já entrega parte do jogo: a plataforma que deveria servir como espaço para conexões profissionais e trocas genuínas acabou se tornando um parque temático da positividade corporativa. Um lugar onde tudo é aprendizado, toda despedida é um ciclo que se fecha e toda adversidade foi, na verdade, um empurrão para o sucesso.
O texto de Maron é cirúrgico. Ele expõe com ironia e precisão os clichês narrativos que se repetem exaustivamente na rede — a metáfora do café, o chefe que ensina com ternura, o estagiário que virou CEO, o agradecimento obrigatório à empresa tóxica. Tudo embalado numa estética de autoajuda higienizada, cuidadosamente roteirizada para parecer espontânea.

Mas o que mais me chamou atenção — e o que quero reforçar aqui — é o quanto essa lógica transforma o LinkedIn num palco onde a verdade não é bem-vinda. Ali, o trabalhador-ator precisa se comportar como o mercado espera que ele se comporte. Não importa o que viveu de fato, importa o que soa bem. Não o que sente, mas o que não inviabiliza oportunidades.
Estamos falando de uma rede social onde:
- Demissões traumáticas são descritas como “transformações potentes”;
- Culturas organizacionais nocivas viram “escolas de crescimento”;
- Falas críticas desaparecem, substituídas por um “agradecimento sincero à jornada”.
No fundo, o que se vê é uma lógica de comportamento corporativo que exige controle da narrativa a qualquer custo. O discurso do “ciclo que se fecha” serve menos para processar uma experiência real e mais para manter viva a ilusão de que tudo o que acontece é parte de uma trajetória perfeita rumo à liderança inspiradora.
Essa atmosfera de otimismo obrigatório é, paradoxalmente, profundamente tóxica. Porque ela:
- Desestimula a vulnerabilidade;
- Apaga o dissenso;
- Torna a comparação um esporte emocionalmente violento.
E o mais curioso é que todos sabem disso. Todos — ou quase todos — já riram de posts forçados, já suspiraram diante das mesmas fórmulas cansadas. Mas o jogo continua. Porque ser honesto, nesse palco, pode custar caro. A crítica pode parecer amargura. A dúvida pode soar como insegurança. O silêncio pode parecer desinteresse.
No fim, nos adaptamos. Passamos a escrever como se esperava que escrevêssemos. Agimos como se fôssemos um pitch ambulante. E, aos poucos, esquecemos como era falar de verdade.
O LinkedIn talvez não mude. Ele reflete a lógica do mercado — e o mercado, sabemos, gosta de narrativas bem embaladas. Mas nós podemos mudar. Podemos tentar resgatar a autenticidade nos bastidores das postagens, nas conversas de verdade, nas trocas que importam.
Como bem disse Maron:
“No mundo real, gente interessante não é insossa.”
Que a gente não precise mais fingir que tudo foi maravilhoso para parecer profissional. Que a gente volte a falar com verdade — mesmo que isso custe alguns likes.
P.S.: Concorda, mas preferiu não comentar? Eu te entendo!
Se esse texto te fez pensar, sinta-se à vontade para curtir, comentar — ou apenas mandar no privado pra alguém que também sente esse incômodo. No LinkedIn, até o engajamento parece ter que vestir terno e gravata. Aqui no blog, não precisa.
2 replies on “A insustentável leveza da fachada”
Eu tenho a impressão que o parecer sempre foi mais importante do que o ser, especialmente no mercado de trabalho, principalmente na frente de estranhos. Reputações sempre importaram.
Talvez só estejamos fartos de tantas exacerbações do ordinário, espetacularizadas pela amplificação das redes sociais?
Um abraço
Tem disso também.
Infelizmente…
Massa tu comentar. Muita gente mandando msg e não comentando pra não deixar rastro.