Esta semana, em meio a uma discussão/conversa em sala de aula, lembrei do teor do central do texto que devo ter visto pela primeira vez já há mais de 20 anos.
Em 1997, o programador e ativista Eric S. Raymond publicou um texto que mudaria para sempre a forma como pensamos o desenvolvimento de software — e, por extensão, a colaboração criativa em tempos de rede: A Catedral e o Bazar. O ensaio, escrito a partir da experiência de Raymond com o desenvolvimento do software Fetchmail, compara dois modelos de produção: o da catedral, fechado, hierárquico e centralizado; e o do bazar, aberto, caótico, mas incrivelmente eficiente.
À primeira vista, trata-se de uma discussão técnica, restrita ao universo da computação. Mas não se engane: esse texto é uma referência fundamental para pensar práticas contemporâneas de cocriação, design colaborativo e produção distribuída — temas absolutamente centrais na formação de qualquer designer do século XXI.
O que diz Raymond?

No modelo da catedral, o software é construído como uma obra monumental: por poucos, em silêncio, com lançamentos esporádicos e controle rígido sobre o processo. Já no modelo do bazar, o código é aberto desde o início; qualquer pessoa pode observar, sugerir, modificar. A metáfora é poderosa: a catedral representa o modelo tradicional, industrial e autoritário de produção; o bazar, por sua vez, encarna o espírito de comunidade, transparência e adaptação constante.
Raymond observa que, com “olhos suficientes”, todos os erros se tornam óbvios. É a famosa Lei de Linus, em homenagem a Linus Torvalds, criador do Linux. Ao invés de confiar apenas em especialistas isolados, o modelo do bazar valoriza a inteligência coletiva e a diversidade de olhares.
Por que isso importa para o Design?
Porque a prática do design também tem se transformado. Modelos baseados em autoria individual, briefings fechados e processos lineares vêm sendo substituídos por abordagens mais abertas, iterativas e participativas. Designers hoje não apenas respondem a demandas, mas também articulam ecossistemas de colaboração com usuários, comunidades, desenvolvedores e outros agentes.
Plataformas como o GitHub, o Figma e mesmo ferramentas de coautoria como o Google Docs carregam, em sua lógica operacional, os princípios do bazar. E para além das ferramentas, a ética da abertura, do compartilhamento e da confiança no coletivo se impõe como referência para quem quer projetar com (e não apenas para) os outros.
Um texto atual
Mais de 25 anos após sua publicação, A Catedral e o Bazar permanece atual. Ele nos ensina que projetos abertos não são, necessariamente, caóticos. Que a descentralização pode ser uma força. E que o design, assim como o software, se beneficia enormemente da crítica constante, da diversidade de perspectivas e da confiança na colaboração.
Para estudantes de graduação em Design, o texto de Raymond é leitura essencial. Não apenas pela sua importância histórica no universo do código aberto, mas porque nos convida a repensar como criamos, com quem criamos, e o que podemos aprender quando deixamos a porta do estúdio aberta para o mundo.
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