Antes de qualquer outra coisa:
Há muito tempo este texto está sendo escrito… Mas nunca consegui parar e concluir da forma como gostaria. Agora há pouco o Hugo Cristo colocou na rede mais um outro texto sobre este assunto. E bate em 100% com o que estava sendo redigido aqui.
Acho que não cabe mais deixar o tempo passar.
A questão é que o Design Thinking não é – creiam, não é – uma coisa nova ou mesmo – o mais importante – uma coisa originária “do/no design”.
Claramente é só mais um dos nomes que aplicam à coisas que já existiam antes, em eufóricos momentos de hype. Estes hypes ajudam ao mercado de design de alguma forma? Sinceramente, eu não sei… Certamente pode ajudar algum nome a buscar um lugar ao sol (ou nas buscas do google). Mas não acredito que seja o caso de discutirmos isto agora.
O blablabla:
Design é uma área naturalmente inter-multi-trans-pluri-megaboga-disciplinar e todos estes hypes abstraem o fato de que a própria epistemologia do design passa invariavelmente por esta necessidade de beber doutras áreas e de suas várias bases epistemológicas. Faz sentido, concordam?!
Na própria IDEO, sabemos, a multidisciplinaridade da equipe de profissionais é um diferencial que eles mesmos exaltam. Psicólogos, Arquitetos, Designers Gráficos, Designers de Produto, Engenheiros de Software… Observem bem, Jocelyn Wyatt, a leader of IDEO’s Social Innovation domain, possui uma formação bastante plural. E este é o ponto que realmente é o diferencial.
Continuando…
Temos: Sociologia, Psicologia, Marketing, Administração, Engenharias, Ficção Científica, Artes Plásticas, etc. Áreas que – em sua maioria ou totalidade – são muito mais antigas e consolidadas em termos de conteúdos que o próprio pseudo-domínio do Design. Aplicamos o “pseudo“, justamente por entender que a maior parte do que nós designers “temos” hoje sob o nosso domínio é um na verdade um substrato – evoluções ou não – do que já há em todas estas outras áreas que constantemente visitamos.
A premissa da interdisciplinaridade nos levaria a considerar que as nossas contribuições – evoluções ou não – aos instrumentos devem (ou deveriam, numa caminhada utópica) ser eventualmente repatriadas aos seus domínios de origem… Utopia?!
Adaptamos aos nossos contextos e necessidades, toda e qualquer ferramenta que se mostre útil para atingir nossos objetivos. Da antropologia, por exemplo, nos utilizamos a etnografia para entendermos nosso público/usuário. Surgem as etnografias rápidas e seus resultados mais imediatos. Este “subproduto” obtido, de forma alguma deixará de ser uma derivação de um instrumento cuja origem está lá na área afim, Antropologia… E por ai vai.
Já há algum tempo, este assunto (o pensar projetual) passou a ser degustado com bastante empolgação. Isto é um movimento interessante de se analisar. Até onde podemos observar a existência de dois entendimentos do “fenômeno” sendo replicados/reverberados no meio: Design Thinking (DT), como um fenômeno contemporâneo que “define a aplicação das metodologias de design na solução de problemas sociais e de negócios“; e o design thinking (dt), enquanto processo para solução de problemas, pura e simplesmente. E com bastante humildade, diga-se de passagem.
Por minhas próprias pernas, acompanho o DT enquanto “fenômeno contemporâneo” que “define a aplicação das metodologias de design na solução de problemas sociais e de negócios” com olhos bastante críticos e desconfiados.
Certas coisas são patentes e já foram muito bem marteladas: método não é metodologia e o que se assume como sendo “do design“, muitas vezes já é algo que foi “expatriado” de outras áreas por nós, os designers.
O dt, enquanto processo para solução de problemas, de fato tem – como em toda e qualquer área – passado por processos de mutação ao longo da história em função das mutações nos paradigmas produtivos, contextos sócio-político-culturais, etc. Inusitado seria – convenhamos – se não fosse assim… Mutação/Evolução – neste sentido – é uma coisa muito profícua.
O que falta levar em conta é que DT, independente de caixa alta ou baixa, é um jargão marketeiro, criado – muito bem criado, é fato – por quem buscava se destacar/diferenciar dentro de seu nicho de atuação. Isto não pode ser deixado de lado… Ou muita coisa fica desvirtuada já na raiz do entendimento da questão.
Em paralelo a este “hype“, ou talvez transversalmente, há uma sinalização de que no futuro o Design será “orientado à humanidade”, como se já não fosse uma área com um enfoque fortíssimo no ser humano ou se fosse possível o Design ser panacéia para os problemas da humanidade…
São coisas que considero extremamente fortes e que podem levar a um entendimento errado do todo. Principalmente por compreender que na atualidade – de onde podemos projetar um futuro – as questões relacionadas com responsabilidade social e sustentabilidade dizem muito mais respeito a uma necessidade das empresas e dos governos de se posicionarem perante a sociedade e assim obter “diferenciais mercadológicos”. Não é – o drive/motivacional desta tendência – “de fato” uma questão humanitária ou uma preocupação ambiental. Entender de outra forma, é ser bastante ingênuo, tolo… O discurso é muito bonito e talvez até melhore o quadro emocional geral, mas o objetivo real por trás, ainda é o um “lucro” imediato. O “bem comum”, as questões humanitárias, as preocupações ambientais, ainda serão secundárias frente aos interesses financeiros/econômicos. É um capitalismo, ora bolas!
Ok… Mundo cão, aula 1, capítulo 1:
- Quem paga as contas dos designers é o mercado;
- O designer trabalha para atender as demandas de um mercado;
- “O mercado”, não é um sinônimo para “a humanidade”.
Vejamos a velha premissa que diz que um “bom design” é duravel. Isto, no mínimo, é uma meia verdade. Se não for interessante ao mercado que um produto de design seja duravel, já era… E o efêmero, sustentável ou não, tem seu mercado/espaço muito bem consolidado. [exemplo 1, exemplo 2]
Já ouço gritos: Heresia!!!! Ele precisará ser sustentável! Ele tem de ser comprometido com as questões sócio-ambientais… Como é possível não ser?! 😉
Tudo isto é algo já consolidado na nossa cultura. E se mudar uma cultura, é algo – pra dizer o mínimo – complicado. Mudar uma industria que funciona se baseando nesta cultura, certamente será ainda mais complicado. E não necessariamente está no Design ou nos Designers a responsabilidade ou a habilidade para mudar isto.
A distância entre o discurso explícito e o latente há tempos é bem perceptível. Não é legitimamente “pensando na humanidade” que estas questões estão sendo colocadas e discutidas no establishment e nas rodas de conversa dos designers… Sejamos menos Pollyannas nestas horas… Por favor.
Na minha mais humilde opinião e como Designer por formação, entendo que a “categoria/classe” tem um sério problema. A natureza do ofício ser tão plural em termos epistemológicos, nos leva a crer que somos mais do que apenas os “eventualmente responsáveis” pelas soluções de todos os problemas da humanidade. Tomamos para nossas mãos as responsabilidades divinais. Alguns acreditam que somos os eleitos, escolhidos e pre-destinados.
Sabemos: Designer não é DEUSigner… O que já é obvio, felizmente, para alguns.
Pergunta nevrálgica: Mas e O que é Design?!
“Design is a creative activity whose aim is to establish the multi-faceted qualities of objects, processes, services and their systems in whole life cycles. Therefore, design is the central factor of innovative humanisation of technologies and the crucial factor of cultural and economic exchange.”
Via – http://www.icsid.org/about/about/articles31.htm.
Ainda na minha mais humilde opinião, esta definição é apenas “razoável”. Pois joga dentro de um enorme e antigo balaio de gatos, mais alguns gatos bigodudos, velhos e malandros. Cultura, Criatividade, Inovação, Humanização… Para cada um destes pontos, cabe – antes de qualquer coisa – um balaio de gatos próprio e específico.
Então, retoricamente falando:
- O que é Cultura?
- O que é Criatividade?
- O que é Inovação?
- O que é Humanização?
Tudo isto, só pra começar.
Uma definição que me agradaria, não deixaria margens para encontrar mais balaios de gatos. Mas talvez não seja possível “me agradar”. 😀
Não tenho uma boa definição de Design no bolso. Tenho “algumas” (Algumas Boas e algumas Péssimas), mas há tempos que já não considero mais “inteligente” tentar achar uma definição. O melhor é justamente continuar buscando definições. No melhor espírito de que “não importa o destino, o importante mesmo é a jornada”.
Uma das piores/melhores (depende dos termos em que isto é colocado) definições de Design que eu já vi/ouvi, saiu de um professor PhD que tive na graduação:
“Design é tudo aquilo que o Designer quiser que ele (o design) seja”.
- Perfeito para quem gosta de/quer deixar o designer sem chão (ou referencial) ou acreditando que tudo pode (ou deve).
- Péssimo para quem não se dá conta que há coisas que simplesmente não estão no escopo do Design ou no job description de um designer.
Um mantra à ser seguido.
E muita gente boa fica fazendo beicinho quando descobre que sua profissão chique, que tem nome em ingrays (afinal, Desenho Industrial em PT_Br é jeca!), não é panacéia para todas as dores do mundo. Quando descobre que políticas públicas e políticas de mercado são coisas distintas então… Vilxe.
A verdade seja dita: O Designer precisa aprender a ser… humilde.
Há de se destacar – é claro – o quanto a discussão sobre o Ego do designer e a discussão sobre os limites da área de atuação dos designers são válidas. Mas falta – e muito – humildade ao designer monolítico para se ver apenas enquanto uma peça dentro de um grande quebra-cabeças. Um coadjuvante numa peça teatral sem protagonistas e num mundo de pontas, onde todos possuem o mesmo grau de importância. Independente das suas bases epistemológicas.
Em qualquer área, o processo para resolução de problemas com poucas variações passa por: entender o contexto; gerar alternativas de soluções; selecionar as soluções adequadas e implementar (testando e refinando, claro) estas soluções. Estas etapas variam em duração, intensidade e tudo mais. Mas em sua síntese, em muito pouco foge disto. A coisa é que: Isto é mais velho que a fome… Não tem como agora ser um hype.
Os instrumentos (métodos) para cada uma destas etapas variam de acordo com as afinidades (e bases epistemológicas) de cada área, é claro. Assim como – claro também – variavam as características cíclicas dos paradigmas de implementação de tudo isto (iterativo incremental vs waterfall, por exemplo). Como disse… inusitado seria se isto fosse diferente.
Concorda?! Discorda?! Deixa uma opinião nos comentários…
7 replies on “Mentalidade projetual”
Let there be light.
Quer dizer que Design Thinking é só o jeito comum, normal de se resolver um problema?
Eu tiro meu chapéu pra esse povo que inventa moda e consegue vender pros bestas, digo, consegue vender gelo pra esquimó.
[…] é o pensamento projetual. Embora possamos encontrar diversas críticas ao Design Thinking e todo o hype que ele gerou (e são críticas mais do que justificadas), gosto de pensar que 2 características […]
[…] é o pensamento projetual. Embora possamos encontrar diversas críticas ao Design Thinking e todo o hype que ele gerou (e são críticas mais do que justificadas), gosto de pensar que 2 características […]
[…] o design thinking. Embora possamos encontrar diversas críticas ao Design Thinking e todo o hype que ele gerou (e são críticas mais do que justificadas), gosto de pensar que 2 características […]
[…] seguindo uma tradição da disciplina, coloquei os alunos para desenvolverem seguindo uma ‘metodologia projetual bastante genérica‘ algumas soluções para um problema artificialmente […]
[…] Mentalidade Projetual, escrito ainda em 2012. […]